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Quem esperou grandeza de Tite, esqueceu 2016.

Tite prioriza suas ambições, mas isso não é novidade

Entre a carreira e o Brasil, Tite preferiu suas ambições. | Buda Mendes/Getty Images | Reprodução Veja

Nessa coluna não vou falar mal do Tite, pois falar mal seria como ressaltar características negativas desse profissional que eu tanto admiro. Esse texto vai é versar sobre uma característica que o Tite não possui: Grandeza política e espírito público.

Nos últimos dias Tite gerou um grande debate nacional: “Será que a seleção boicotaria a copa América?”


A copa América, organizada pela Confederação Sul-Americana de Futebol (CONMEBOL), originalmente estava prevista para acontecer na Colômbia, porém, o país está passando por uma crise política gravíssima com protestos diários e repressão violenta por parte das forças militares. Nesse caso, a segunda opção seria a Argentina, um país arrasado pelas políticas econômicas liberais de Maurício Macri, teria uma oportunidade de dar um pequeno gás na sua economia, porém, apesar das possíveis vantagens econômicas, o evento esportivo levaria um risco desnecessário para agravar a situação da pandemia do país.


Com a competição rejeitada por dois países preocupados com suas respectivas situações sociais e sanitárias, restou à CONMEBOL procurar por um país com um governo irresponsável e despreocupado com a pandemia. O governo federal prontamente aceitou, mesmo governando o país com uma das piores condições pandêmicas atuais.


Após alguns dias de especulação e fuga do treinador, sempre que perguntado sobre seu posicionamento e o posicionamento de seus atletas sobre a polêmica competição, veio à tona o que qualquer um que acompanhe a carreira do treinador já esperava. Os atletas assinaram uma carta dizendo que reprovavam a realização da competição nesse momento, mas sequer se deram o trabalho de elencar os motivos pelos quais discordam da realização da competição.


Essa resposta pôs fim ao surreal otimismo daqueles que acreditavam que um ato de grandeza viria de profissionais que dependem da seleção para se projetarem no cenário internacional e de um treinador que nunca fez questão de ser grande cidadão, ou um cidadão politizado, apenas um excelente profissional.

Observe:


 

“...Tite, é um exemplo de profissionalismo, dedicação, ética (profissional), persistência, motivação, honra, honestidade e caráter. Um homem inteligentíssimo que comprovou que é possível vencer mantendo todos esses valores em um trabalho muito transparente...


...PERDEU A CHANCE DE ENTRAR PARA A HISTÓRIA:


Nos últimos dias após o vexame da seleção brasileira na Copa América, Tite viu a CBF rastejar aos seus pés, pedindo “pelo amor de Deus” que ele aceitasse logo esse cargo de técnico...

...Foi aí que o Tite errou. Era a hora do Tite vir a público e fazer exigências gritantes, era a hora do Tite dar as cartas, jogar a mídia e a população contra os cartolas que estão ano após ano acabando com o nosso futebol. Tite deveria ter feito exigências públicas como, por exemplo, exigir a mudança do estatuto da CBF com a inclusão de eleição de voto simples e direto, dando direito a votos para todos os clubes até a 4ª divisão; exigir que a CBF aumentasse o investimento nas divisões mais baixas do futebol brasileiro e das categorias de base. Assim teríamos uma safra melhor de talentos no futuro e reduziria a desigualdade nos salários dos atletas; deveria exigir um calendário mais profissional e ativo para clubes de todas as divisões do futebol. Fazendo com que 90% dos atletas tivesse emprego por 12 meses e não apenas 4 meses por ano; Tinha que ter exigido investimento no futebol feminino; Exigido uma gestão mais transparente e democrática; Exigido teto de ganhos para os cartolas; Exigido que a CBF criasse contrapartidas sociais; Exigido mais transparência na negociação com as emissoras de TV; Enfim, deveria ter exigido que a CBF se tornasse uma instituição de respeito, uma instituição limpa e honrada... Mas o Tite perdeu a chance de entrar para a história. Será "apenas" um dos melhores profissionais que já passaram pela CBF e, tomara que traga alguns títulos pelo menos como prêmio de consolação para os Brasileiros que perderam mais uma chance de ver a CBF ser passada a limpo.


Sucesso Tite, porque VOCÊ merece, a CBF não!”

 

O texto reproduzido acima "Tite perdeu a chance de entrar para os livros de história do futuro" foi escrito por mim, há 5 anos. Naquela ocasião Tite deixava sua campanha vitoriosa no Corinthians e se entregou para seu sonho, treinar a seleção brasileira em busca daquele que parece ser o título mais importante para qualquer treinador, a taça do mundo.

Até aí tudo bem, não há nada mais natural para um treinador com uma trajetória tão vencedora, almejar uma posição de destaque no futebol nacional e mundial. Porém, o contexto daquele momento tinha uma investigação do FBI prendendo cartolas do futebol internacional, dentre eles os ex-presidentes da CBF, Ricardo Teixeira e José Maria Marin, detidos em uma operação do FBI que também indiciou o então presidente da entidade, Marco Polo Del Nero, levando a CBF ao vexame de não ter seu presidente acompanhando a delegação em jogos oficiais, pois, em países com acordo de extradição para os EUA, ele corria o risco de ser preso, tal qual os outros dois cartolas.


Na mídia especializada e até nos folhetins de maior audiência do Brasil, como o Jornal Nacional, as críticas eram constantes e as notícias de escândalos diárias. Todos os comentaristas e jornalistas que cobrem o esporte, criticavam o obscurantismo que envolvia toda a falta de transparência da polêmica entidade que, apesar de vastamente investigada por órgãos internacionais, consegue se manter blindada no Brasil.


Outras críticas que a entidade recebia à época também diziam respeito a falta de incentivo para clubes menores, incentivos esses que, caso fosse destinado ao fomento da prática esportiva no país, poderia, por exemplo, ter evitado a tragédia envolvendo a Chapecoense, um clube brasileiro que para conseguir competir em uma competição internacional, precisou, por falta de apoio financeiro e logístico da CBF, recorrer à contratação de empresas em condições precárias para transportar o time. Transporte esse que não significaria nenhum custo relevante para a entidade mor e mais lucrativa do futebol brasileiro, mas que ao time do Chapecoense custou muito caro, lhes custou a vida.


No dia 23 de fevereiro de 2016, apenas 4 meses antes de Tite ser convidado por Del Nero a comandar a seleção, a própria CBF divulgou um estudo chamado “Raio-X: Salário dos jogadores” mostrando que 82% dos jogadores profissionais do Brasil ganhavam menos de R$ 1.000 por mês. Muito disso devido à falta de incentivo a competições para os pequenos times, que sem ter pelo que competir, dispensam seus jogadores logo após o fim dos campeonatos locais, que costumam não durar mais do que 4 meses. Nos outros 8 meses, sem incentivo, sem apoio, sem investimento da CBF, os clubes não têm o que fazer a não ser deixar os jogadores à própria sorte.


Mesmo com tudo isso, Tite topou o convite sem nenhuma exigência reformista. A contratação de Tite foi o pão e circo que a CBF precisava para fazer a imprensa e os torcedores esquecerem todos os desmandos da entidade.


O texto que eu postei é de junho de 2016, mas continua atual. Tite é um grande profissional, talvez o melhor em atividade no futebol até hoje, mas não é afeito por gestos de grandeza. Em 2016 perdeu a chance de passar a CBF a limpo, em 2021 perdeu a chance de prestar uma grande homenagem às famílias dos mais de 480 mil mortos.


Até agora uma marca de cartões de crédito e duas empresas de bebida já retiraram o patrocínio que destinariam à competição, mostrando uma vontade de acertar com a sociedade, muito maior do que a de Tite e seus atletas que apesar da má fama que receberão, ainda ganharão muito dinheiro para limpar suas consciências.


Para evitar frustrações, do Tite podemos esperar no máximo alguns títulos. Mas gestos de grandeza com atitudes em prol de desconhecidos que eventualmente prejudique suas ambições, isso não devemos esperar. Tite já deixou claro que a prioridade é a carreira dele, cada um que lute pela própria sorte, ou pela própria vida:


“– Não sou hipócrita, não sou alienado e sei que as coisas acontecem. Mas sei dar prioridade. Prioridade é meu trabalho e a dignidade do meu trabalho.”

Ou como dizia na carta de repúdio dos atletas.

“... lembramos que somos trabalhadores, profissionais do futebol. Temos uma missão a cumprir com a histórica camisa verde amarela pentacampeã do mundo. Somos contra a organização da Copa América, mas nunca diremos não à Seleção Brasileira.”

As palavras estão aí, cada um que interprete como quiser, mas eu achei a cara do Tite. A impressão é que o importante para ele é tentar ganhar mais um título e que a vida de milhares de brasileiros é menos importante, ou simplesmente, não é problema dele e de sua equipe.


Vale ressaltar que o gesto, aparentemente, egoísta do treinador da seleção, não zela apenas pelos interesses dele, mas também pelos de seu filho, que sem nenhuma conquista significativa no currículo, foi preferido e ocupou cargos de prestígio no Corinthians e, sob as asas do pai, hoje é o número 2 da comissão técnica da CBF, auxiliar do pai. Nepotismo? Talvez apenas coerência dos atos de quem acha que o importante é colocar os próprios interesses a frente da sociedade.


Tite perde, dessa forma, a segunda chance de entrar para os livros de história do futuro, não como apenas mais um treinador que fez uma carreira vitoriosa. Poderia ser lembrado como o cara que mudou o esporte para melhor, que desafiou os poderosos, que prejudicou sua carreira na CBF para fazer o que era certo.


Talvez em breve Tite consiga o tão sonhado título mundial — se não for traído, pela entidade que ele tanto defende, e demitido antes disso — vai depender do resultado da Copa América, das forças políticas e da sua capacidade de se manter de joelhos para as vontades da CBF.


Para os amantes de grandes frases do futebol, parafraseio Vicente Matheus: “haja o que hajar” Tite deve sair da Copa América menor do que entrou. Mesmo que as grandes chances de título se confirmem. Escolhas.

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