Crítica: Curral (Marcelo Brennand, 2021)
Uma curiosa obra sobre a política no Brasil profundo
O Brasil sempre foi um país de polos políticos, direita, esquerda, extrema-direita, centro e tantos outros posicionamentos. Nas últimas eleições federais, o país entrou de vez no clima da polarização e o cinema, gigante como é por natureza, tem registrado e mostrado todos esses polêmicos momentos do nosso país. Os cineastas nordestinos, mais do que em qualquer outra região do Brasil, têm mostrado isso com louvor e Curral, do pernambucano Marcelo Brennand é mais um exemplar que mostra a nossa política.
O filme se passa em Gravatá, uma pequena cidade do interior pernambucano, dividida em distritos, a cidade está sempre em crise hídrica, falta água para todos. No meio disso, somos apresentados ao protagonista Chico Caixa (José Aquino), sujeito trabalhador que dirige um caminhão pipa fornecendo água para sua comunidade. Depois de fornecer água ilegalmente para um grupo de moradores da área rural, Caixa acaba ficando sem emprego, ele se junta então ao amigo Joel (Rodrigo Garcia) que está numa campanha política para concorrer ao cargo de vereador. O protagonista Chico sabe que isso vai ser “uma roubada”, mas é a única solução para não ficar desempregado.
O filme mostra não só como nossa política é suja, mas também como nós, seres humanos no geral, somos facilmente corrompidos, especialmente quando “não temos onde cair mortos”, Chico vai, pouco a pouco, abrindo mão dos seus limites morais e entendendo que para chegar aonde quer, precisa vender parte da sua alma. Já Joel, rapidamente parece aceitar essas novas condições, se transformando no pior tipo de pessoa que ocupa os variados cargos públicos do Brasil.
O mérito do filme fica no tom realístico ao mostrar as falcatruas dos candidatos e nos diálogos dos personagens, desde aqueles que são destaques, como Aquino e Garcia que estão excepcionais em cena - especialmente Garcia que é um dos melhores atores da nova geração e que precisa ter seu trabalho explorado - até os eleitores que fazem participações. Aliás, a maioria dessas pessoas não são atores profissionais, mas sim moradores de Gravatá-PE que participaram das filmagens.
O Brasil pode até ter mudado de alguns anos pra cá, a proibição de comícios, panfletagem, boca de urna, mas cá pra nós, isso tudo é fachada, Curral mostra como era um eleição antes de todas essas proibições, mas em pequenas cidades como Gravatá (a cidade é real), não dá para duvidar que compra de votos e falsas promessas aconteçam de forma escancarada, bandeirolas e figurinos multicoloridos, trios elétricos enormes com músicas que grudam na cabeça e toda população da cidade andando e festejando pelas ruas, são situações que imprimem perfeitamente a disputa eleitoral dos interiores brasileiros, mérito ainda maior é do diretor usar longos planos, fazendo parecer um documentário e que estamos diante de uma verdadeira campanha política.
Não é nenhum filmaço, mas para quem ainda vive no “conto de fadas político”, pode ser um soco na mente. Acordem!
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