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Crítica: Estou Me Guardando Para Quando o Carnaval Chegar (Marcelo Gomes, 2019)

O maravilhoso documentário de Marcelo Gomes que mostra as raízes de um povo "raçudo" que encontra sua redenção no carnaval.

Documentário: Estou Me Guardando Para Quando o Carnaval Chegar (Marcelo Gomes, 2019)

Marcelo Gomes é um dos diretores mais enraizados, transitórios e versáteis do nosso cinema. Para quem não é muito familiarizado com sua obra, ele é o diretor de “Cinema, Aspirinas e Urubus” (2005), mostrando dois “amigos” e, com abordagem completamente diferente, em parceria com Karim Aïnouz, dava um toque documental para o drama “Viajo Porque Preciso, Volto Porque te Amo” (2009) em que retrata o sertão nordestino pelos olhos do José Renato (Irandhir Santos) um geólogo que faz levantamento de fontes de água.


Agora, em seu novo documentário, Gomes faz uma viagem pessoal por onde passou quando ainda era criança com seu pai, na cidade Toritama – PE, o centro ativo do capitalismo local, onde mais de 20 milhões de jeans são produzidas anualmente em fábricas caseiras. Os moradores locais orgulhosos de serem os próprios chefes, os proprietários destas fábricas trabalham sem parar em todas as épocas do ano, exceto o carnaval, que é quando chega a semana de folga. Eles vendem tudo que acumularam, inclusive eletrodomésticos para poderem ir descansar em praias paradisíacas enquanto aguardam a chuva que, tradicionalmente chega após o último dia de carnaval. Hábitos que se repetem ano após ano.


O cineasta e diretor do filme caminha por Toritama e ele claramente tem uma relação especial, particular com a cidade, Marcelo Gomes não só ocupa a cadeira de diretor, mas também é o protagonista, ele se coloca em cena, tanto na imagem quanto no som, expondo-se em suas motivações, suas abordagens de entrevista aos moradores e suas escolhas de enquadramento. Em uma das cenas mais marcantes, um dos trabalhadores faz um trabalho manual, um trabalho cansativo, incessante, repetitivo, na cena o diretor tira o som da máquina de costura e explica o motivo daquilo.

Documentário: Estou Me Guardando Para Quando o Carnaval Chegar (Marcelo Gomes, 2019)

Marcelo esperava encontrar a mesma cidade de sua memória afetiva, de quando ainda era criança, uma Toritama calma, mas se depara com a agitação de um capitalismo improvisado e acelerado, uma cidade que não para de trabalhar nunca, eu particularmente não consegui captar se o diretor estava frustrado ou não, mas para qualquer efeito, ele usa o que está diante de seus olhos e sua câmera com uma meta: documentar a rotina, os sonhos e objetivos daquelas pessoas.


O interessante é que o diretor parece dividir o documentário em duas classes – lembrando que ele é o protagonista, logo, também é um personagem – ele, o protagonista tem um posicionamento progressista, que hoje vive na cidade grande e guarda na lembrança uma imagem romântica do interior nordestino silencioso; do outro lado, pessoas sem formação acadêmica, com a fala atrapalhada, cujo investimento na produção do jeans permitiu um salto veloz na qualidade de vida. Aquelas pessoas ali entrevistadas não são pobres, elas são humildes e em uma das entrevistas uma entrevistada diz que quem imagina que a vida de quem vive em Toritama é ruim, está muito enganada.

Gomes filma obsessivamente as máquinas de costura em funcionamento, as mãos ágeis operando os tecidos, as calças sendo desfiadas e bordadas, os vendedores negociando preços, mostrando com maestria como as pessoas ali são dedicadas e que acima de tudo gostam do que fazem.


O filme é brilhante em sua própria humildade, Marcelo Gomes sabe o que faz, sabe como abordar pessoas, sabe como capturar os momentos, sabe que o trabalhador se cansa e que dorme no meio do expediente, sabe que o trabalhador tem mil e uma profissões, que sabe fazer tudo, é um documentário inspirador e gigante, assim como nós brasileiros.

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